Texto de Alisson Gutemberg



Sempre que penso nos melhores filmes brasileiros, entre tantos outros, me recordo de Durval Discos. Também de Deus e o Diabo na Terra do Sol (talvez o meu preferido), O Pagador de Promessas e O Bandido da Luz Vermelha, por exemplo. Não há como fugir desses.


De todo modo, há em Durval Discos dois elementos que me cativam: o primeiro é a nostalgia do vinil. A nostalgia de um tempo em que ouvir música era um ritual. A cultura midiática (ou das mídias), da qual fala Lúcia Santaella, por exemplo, era marcada pelo aspecto físico dos bens culturais. Bem diferente da era do acesso que a cibercultura promoveu e que foi levada ao extremo com a experiência do streaming. Para um colecionador de discos, nesse caso, o filme de Muylaert é uma linda viagem no tempo.


O segundo é a relação entre a cidade e a sua imagem. Minha tese de Doutorado, por exemplo, é sobre isso. A forma como o cinema representa esses espaços é algo do meu interesse particular. E Durval Discos é fantástico nesse ponto. Algo que fica evidente logo na primeira cena do filme. Quando a câmera, em um belo plano-sequência, transita pelas ruas de São Paulo - tal qual um flâneur de Baudelaire e em um movimento que remete ao O Homem na Multidão de Edgar Allan Poe - até adentrar na loja de Durval e nos apresentar personagem e espaço físico.


O filme transborda nostalgia. E Durval (o personagem) personifica esse sentimento na forma que se veste, como fala, e, principalmente, na maneira que escuta música. É um discurso sobre uma cidade que foi e que já não é mais. Fala de um outro tempo, de uma outra era. É como Meia Noite em Paris (Woody Allen), por exemplo.

Fonte imagem: Durval Discos (Anna Muylaert)


Referências:


Culturas e arte do pós-humano: da cultura das mídias à cibercultura - Lúcia Santaella (https://amzn.to/2Ui379v)

O pintor da vida moderna - Charles Baudelaire (https://amzn.to/3eWn25G). Ps: contém o texto de Poe. 

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